CURSO PARA LÍDERES JOVENS

23-01-2009 14:08

 

Unidade 1:     Conhecendo-se melhor: Visualizando os espelhos disponíveis   Amauri Munguba Cardoso

Unidade 2:     Enfrentando a ansiedade  Amauri Munguba Cardoso

Unidade 3:     O que é depressão?  Amauri Munguba Cardoso

Unidade 4:     Curando feridas emocionais  Roberta Batista Silveira do Carmo

Unidade 5:     A solidão do líder  Amauri Munguba Cardoso

Unidade 6:     Fracassos, derrotas e frustrações: aprendendo a crescer  Roberta Batista Silveira do Carmo

 

 

Unidade 1

 

CONHECENDO-SE MELHOR

 

Amauri Munguba Cardoso *

 

 

A PESSOA E PAPEL

 

Estar na liderança torna privilégio e responsabilidade inseparáveis companheiros de caminho. Liderar é uma missão que destaca e posiciona alguém diante de um grupo. Uma tarefa exigente e desafiadora. Além de muitos conhecimentos requer uma razoável estrutura emocional. Quem a desempenha é antes e, acima de tudo, uma pessoa. A natureza e qualidade desta pessoa dão sustentação e credibilidade à tarefa que desempenhada no papel de liderança.

 

Pessoa e papel não são a mesma realidade. O líder é compelido a uma atuação coincidente com as expectativas, desejos e necessidades do grupo, a tornar-se um personagem. Muito facilmente pode-se confundir o que é realmente, com o que lhe é atribuído pelos componentes do grupo. O grupo projeta no líder uma identidade idealizada que, muitas vezes, pode em nada corresponder à sua própria.

 

A pessoa de fato costuma ser menor que a aparência que lhe é dada pelo personagem. Talvez, por isso, seja tentadoramente mais fácil e freqüente uma identificação com o papel (personagem) do que assumir a "dor e a delícia" que só a pessoa pode carregar.

 

SER X PARECER

 

"Mas, pela graça de Deus eu sou o que sou". Com estas palavras o apóstolo Paulo apresenta-se aos leitores de todos os tempos. Fala de sua essência pessoal mais do que quaisquer predicados externos. Aliás, ele havia espontaneamente dispensado uma considerável porção de atributos exteriores pela incomparável experiência de possuir uma autêntica experiência pessoal e interior. Se lembrarmos que a tentação de buscar a aparência persegue a todos desde os primórdios, entenderemos que há um grande desafio em suas palavras (I Cor. 15:10; Fil. 3:4-11).

 

Feitos por um pouco menores do que Deus. As criaturas estão sempre à espreita de uma oportunidade de ser como Deus. Seja comendo do fruto proibido, edificando torres para alcançar os céus, afirmando de modo obcecado o próprio desejo contra a vontade do Criador, dando ouvidos às bajulações dos semelhantes ou sendo atraído e seduzido pela voz do tentador. A vaidade, o orgulho e a soberba estão enraizadas na natureza humana. São danos que se introduziram de uma vez para sempre no nosso coração (Sal. 8:5; Gen. 3:5; 11:4; Rom. 1:18ss; I Cor. 4:7).

 

O SER E O FAZER

 

Cada pessoa deixa uma marca pessoal naquilo que realiza. Não importa qual seja a tarefa. Decorar um ambiente, preparar uma refeição, ministrar uma aula, atender ao telefone, redigir um comunicado ou dirigir uma reunião, são tarefas feitas diferentemente por pessoas diferentes, mesmo tendo recebido o mesmo treinamento. Ainda que os ingredientes da refeição, o tema da aula ou a pauta da reunião sejam os mesmos. É inevitável, cada pessoa deixa mostras de sua personalidade em tudo o que faz. O ser precede, subsiste e interfere claramente, determinando a qualidade do fazer.

 

Nos treinamentos de liderança, comumente, a ênfase recai sobre o desenvolvimento de habilidades para o exercício da tarefa. Naturalmente, isto é importante. Todavia, não é suficiente, uma vez que o ser precede o fazer. Não basta o domínio da técnica, pois, muitas vezes a questão decisiva depende muito mais de qualidades da pessoa, do que propriamente de suas habilidades. Ainda que os melhores procedimentos sejam estabelecidos e as melhores habilidades sejam desenvolvidas, não havendo qualificação pessoal, grandes comprometimentos poderão continuar presentes.

 

O FAZER E O SER

 

O hábito não faz o monge. Se for verdade o que diz o ditado popular, devemos concordar que o hábito pode, ao menos, emprestar uma significativa referência de identificação. Muitas vezes o uso continuado do hábito termina por produzir no usuário uma pseudo-identificação. O fazer cotidiano afeta significativamente a natureza de uma pessoa. Ocupando por muito tempo o lugar de quem toma as decisões, responde às questões, aponta os caminhos e modera as relações do grupo, o líder pode terminar tendo de si uma imagem pessoal derivada de sua função. Deixa de ver-se pelo que é, passando a ver-se pelo que faz.

 

Os próprios liderados contribuem para estabelecer esta identidade secundária do líder. Tanto suas expectativas idealizadas como suas projeções constrangem o líder a corresponder ao papel que lhe é atribuído. Muitas dessas expectativas são irreais, derivam da necessidade de transferir para alguém a responsabilidade pela segurança pessoal ou grupal. Embora como pessoa, o líder carregue os mesmos atributos que os liderados, investido da função e com o contínuo exercício da mesma, tende a diferenciar-se. As tarefas religiosas, especialmente, sobrecarregam o líder com projeções idealizadas. Espera-se que o líder esteja identificado com os conteúdos que anuncia e representa. Com o passar do tempo é visto como quem está vinculado, de uma forma especial com os conteúdos sagrados, por isso, como quem tem mais poder que os ademais.

 

Um exemplo freqüente dessa realidade no ambiente eclesiástico é a crença comum, ainda que sem qualquer fundamentação bíblica, que gira em torno do pastor. Suas orações são tidas como mais poderosas que as de outros componentes do grupo. Sua palavra parece mais inspirada, assim como seus atos de modo geral parecem revestidos de uma significação ampliada. A visita do pastor causa uma impressão incompreensivelmente maior que a de qualquer outro membro da comunidade, mesmo que objetivamente diga ou faça o mesmo que qualquer outro poderia fazer. Estamos diante de uma realidade simbólica. Não há como justificar este valor diferenciado, senão pelos conteúdos subjetivos lançados individualmente sobre o líder e reforçados coletivamente. Embora isto aconteça em todos os planos sociais e culturais, parece que quanto mais simples culturalmente for o grupo, ou quanto mais mística for a relação, maior será o poder do líder sobre os liderados.

 

INTEGRANDO SER E FAZER

 

"Quem anda em integridade anda seguro" (Prov. 10:9). Estas são as palavras milenares da sabedoria bíblica. Integridade é o mesmo que inteireza, produto de uma unidade resistente e bem estabelecida entre os diversos aspectos e expressões da vida. Quem conquista integridade desfruta de harmonia interior, sente-se segura e manifesta segurança em suas atitudes. O apóstolo Paulo agrega uma contribuição a esta idéia, quando diz: “Bem-aventurado é aquele que não se condena naquilo que aprova” (Rom. 14:22). Quando o que é feito reflete o que é sentido e desejado interiormente, e o que é experimentado no interior pode manifestar-se através do que é feito, conquista-se uma indiscutível felicidade. O ser manifesta-se naturalmente através do fazer, enquanto este deve sempre refletir as qualidades do ser.

 

O desafio do líder consiste em manter o ser e o fazer em harmonia. Evitando um lado a timidez que impeça o ser de manifestar-se e, de outro, a hipocrisia que falsifique ou amplie as manifestações do ser. Esta fidelidade a si mesmo pressupõe autoconhecimento, coragem e disposição para a autenticidade. É sempre bom lembrar que, embora, esses desafios não sejam fáceis, não há outro caminho seguro e confiável para o exercício de uma liderança, além deste.

 

EXEMPLO DE JOÃO BATISTA 

 

João Batista foi alguém que deixou marcas bastante significativas e desafiadoras. Quem aspira a liderança cristã deve aprender muito com o exemplo de João. Em sua vida, alguns dos elementos mencionados acima estão harmonizados de forma encantadora, feliz e inspiradora:

 

1. Coragem para ser exatamente quem se é. Num tempo em que havia um verdadeiro vácuo religioso entre os judeus, João poderia facilmente ter sido sugado pelas confusas expectativas messiânicas presentes entre o povo. Quando sua fama de pregador se espalhou, recebeu a visita de sacerdotes e levitas, líderes religiosos, que prontamente indagaram-lhe: “Quem és tu?” Interessante como João apressou-se a responder: “Eu não sou o Cristo”. Interrogado insistentemente se não seria ao menos uma figura profética especial, João respondeu pronta e negativamente a todas as insinuações. Se os próprios líderes estavam confusos sobre o significado de sua vida, bem poderia ele ter se confundido também, ou, ainda mais grave, ter se valido da ignorância deles em benefício próprio. Seria tentador tomar sobre si, por exemplo, os créditos do extraordinário profeta de Elias. Mas João não queria para si outra identidade que não a sua própria (Jo. 1:19-21).

 

2. Consciência da identidade e da missão. "Eu sou a voz do que clama no deserto". Estas palavras são eloqüentes e definidoras. Estabelecem com clareza uma identidade intimamente associada ao propósito que Deus lhe havia confiado para desempenhar. Ao mesmo tempo em que diz o que ele não é, aponta para o que veio para ser: arauto, mensageiro, precursor. A consciência de significado, lugar e missão estavam claras na mente de João. Pregava, batizava, exortava, com firmeza e segurança, pois para isso havia sido comissionado pelo Senhor. João era simultaneamente pequeno e grande. Pequena era a duração e abrangência de sua tarefa. Grande era a autoridade e a intensidade com que se envolvia com a missão (Jo. 1:22-28).

 

3. Coragem para aceitar os limites de sua missão. "O homem não pode receber coisa alguma se do céu não lhe for dada... Quem tem a noiva é o noivo... o amigo se alegra quando ouve a voz do noivo. Pois esta alegria já se cumpriu em mim". Com estas palavras João acalmou seus próprios discípulos, indignados com a crescente fama de Jesus. Naquele instante João demonstra haver entendido o alcance de sua missão. Era chegado o momento de sair de cena para que os refletores iluminassem o ator principal (Jo. 3:27-29).

 

4. Humildade para promover a Cristo. "Convém que ele cresça e que eu diminua". Foi assim que João despediu-se do seu ministério de grande repercussão pública. Assumiu, diante daqueles que o admiravam, o papel de coadjuvante. Dando a Jesus a vez e o espaço livre para ação. Como antes havia anunciado, "aquele que vem após mim é mais poderoso do que eu, cujas sandálias não sou digno de levar", chegado o momento, demonstrou em atos o que dissera. Humildade foi, certamente, um traço que contribuiu para tornar mais impressionante a vida daquele homem (Jo. 3:30; Mt. 3:11).

 

5. Força do caráter. Alguns aspectos da vida pessoal de João (sua vestimenta e alimentação, por exemplo) poderiam contribuir para desautorizá-lo como uma figura popular e, mais ainda para enfraquecê-lo diante de autoridades. Sua integridade porém tornou-se bem mais visível e notória qualquer sinais externos. Diante do rei Herodes, aquela figura mal vestida e, provavelmente, desfigurada pela condição de prisioneiro, não demonstrou a menor vacilação. Denunciou publicamente a condição de imoralidade em que se encontrava. Pelo que diz o Evangelho, o rei, por sentir-se pessoalmente desajustado, temia e tremia diante do solitário andarilho dos desertos que, sem qualquer poder exterior, escorava-se num indestrutível caráter indiscutivelmente justo e santo (Mc. 6:17-20).

  

 

Unidade 2

 

ENFRENTANDO A ANSIEDADE

 

Amauri Munguba Cardoso *

O QUE É ANSIEDADE

 

A ansiedade já foi descrita como o maior mal do século XX. No tempo em a humanidade experimentou conquistas técnicas e científicas admiráveis, passou, também, a experimentar maior fragilidade e insegurança. A aceleração do ritmo de vida, as grandes aglomerações urbanas, a perda do contato direto com a natureza, a instabilidade econômica e a violência crescente, são alguns dos fatores que cooperaram para o agravamento da condição humana.

 

A ansiedade é um sentimento de apreensão, um incômodo, um mal-estar às vezes traduzido por medo ou insegurança. Produz alterações orgânicas diversas e nocivas se mantidas por tempo prolongado. Nos últimos tempos usou-se muito a palavra stress para descrever o conjunto de alterações encontradas nesta condição. É natural sentir-se ansioso diante de fatores externos vistos como ameaçadores ou geradores de insegurança. A condição humana está repleta de situações assim. Todavia, muitas vezes, percebe-se que a reação manifesta por alguém é desproporcional à ameaça. Outras vezes não há uma ameaça externa localizável e, ainda assim, a inquietação e mal-estar internos continuam presentes. Nestes casos são fatores da personalidade e não da realidade que estão promovendo a ansiedade.

 

Ansiedade neurótica é o nome que se dá aos sentimentos exacerbados de insegurança e medo, frente a situações comuns ou perigos inexistentes. Em níveis moderados a ansiedade é constitutiva da vida e, até mesmo, desejável. Contribui para acelerar os movimentos pessoais, desperta criatividade e dinamiza o sujeito na busca de solução para os problemas. Em níveis mais elevados, tem efeito contrário. Diminui a capacidade de atenção, de concentração e realização, obstrui a solução de problemas, enfim, paralisa o indivíduo. Além disso, pode produzir sintomas orgânicos indesejáveis.

 

CAUSAS DA ANSIEDADE

 

AMEAÇA:

Quando aquilo que alguém considera fundamental para a sua existência física ou psicológica sofre, ou está preste a sofrer um impacto. As ameaças podem ser assim classificadas:

 

a) Perigo: Situações de violência que expõem a fragilidade física do indivíduo. A constatação de uma doença, uma cirurgia, o desemprego, mudança de trabalho ou moradia.

 

b) Auto-estima: Quaisquer situações que afetem a imagem pessoal ou a necessidade de aceitação e reconhecimento. Nesta linha entram também a exposição pública, momentos de prova e o início de novos relacionamentos.

 

c) Perdas: Lutos, separações, interrupção de relacionamentos importantes produzem grandes incertezas quanto ao futuro, além de sentimentos de vazio interior e perplexidade. Tudo isso mobiliza muita ansiedade.

 

d) Fatores Inconscientes: Ameaças reais ou imaginárias expulsas da mente consciente, por serem desagradáveis, costumam retornar mais tarde, com a agravante de não se saber porque, nem como enfrentá-las. Nesta linha estão o pânico e outras incômodas manifestações de ansiedade.

 

CONFLITOS:

Ocorre quando a pessoa é posta entre duas ou mais possibilidades de escolha e precisa dar uma resposta. Existem três configurações básicas deste conflito:

 

a) Aproximação-aproximação: Quando a decisão gira em torno dois elementos considerados igualmente desejáveis (Exemplo: Receber dois convites igualmente desejados para a mesma data, em locais distintos).

 

b) Aproximação-fuga: Quando um mesmo fato desperta simultaneamente sentimentos positivos e negativos, por haver vantagens e desvantagens envolvidas (Exemplo: Ser promovido a um novo cargo, mas ter que viajar e trabalhar mais tempo, ficando longe de casa e da família).

 

c) Fuga-fuga: Quando as duas alternativas são indesejáveis (Exemplo: Aceitar uma função que obrigue a morar numa cidade distante, ou ser demitido).

 

NECESSIDADES NÃO SATISFEITAS:

 

Quando alguma das necessidades fundamentais não pode ser atendida pelo sujeito:

 

Sobrevivência: saúde e continuidade de vida;

 

Segurança: física, econômica e social;

 

Sexo: como expressão de amor e compromisso;

 

Significado: reconhecimento como pessoa de valor;

 

Auto-realização: desenvolvimento de dons e alcance de objetivos pessoais;

 

Personalidade: senso de identidade pessoal;

 

Transcendência: sentido espiritual e segurança quanto à vida após a morte.

 

EFEITOS DA ANSIEDADE

Sem nenhuma ansiedade a vida seria enfadonha e aborrecida. O desenvolvimento humano é promovido graças a certos níveis de insatisfação e ansiedade. Elas motivam as buscas e promovem novas conquistas. Quando a ansiedade se avoluma, contudo, produz uma variedade de reações nocivas:

 

REAÇÕES FÍSICAS: Úlceras , dores de cabeça, alergias de pele, alterações do apetite, alterações do sono, sensação de fadiga, descontrole urinário, diarréia e outras. Quando de longa duração podem produzir efeitos graves sobre o organismo. Nesta esteira estão os sintomas e doenças psicossomática.

 

REAÇÕES PSICOLÓGICAS: Redução da memória, rebaixamento da produtividade intelectual e da criatividade, intolerância, inquietação, hiperatividade, perturbação dos relacionamentos, medo e agressividade desproporcionais. Pessoas mais inteligentes são mais susceptíveis à ansiedade desta ordem, contudo, desenvolvem mais facilmente meios de controlá-la.

 

REAÇÕES DEFENSIVAS: Diante de uma ansiedade crescente é comum à utilização dos chamados mecanismos de defesa do ego: projeção, negação, racionalização, formação reativa e outros. Esta é uma fuga inconsciente do enfrentamento das causas da ansiedade. Agindo assim pode-se ignorar (negação), atribuir a outros a responsabilidade pelos problemas (projeção), arranjar explicações lógicas, porém, ineficazes para a solução da questão (racionalização).

 

REAÇÕES ESPIRITUAIS: A ansiedade tanto pode motivar a busca acentuada da ajuda divina, como pode obstruir o contato com os recursos devocionais (oração, meditação e leitura da Palavra). O ansioso tem dificuldade de aceitar o tempo e o ritmo da ação divina. Seu desejo de apressar a resposta pode conduzi-lo rapidamente à desilusão espiritual.

 

PREVENÇÃO DA ANSIEDADE

Algumas atitudes que podem ser úteis na prevenção da ansiedade:

 

1. Manter-se envolvido em atividades produtivas e realizadoras;

2. Reconhecer seus limites de competência e responsabilidade e não concentrar tarefas excessivas sobre si mesmo;

3. Estar atento e admitir a presença de temores, inseguranças e conflitos, sempre que surgirem;

4. Falar sobre os sentimentos acima mencionados com alguém de sua confiança, regularmente, se possível;

5. Avaliar periodicamente os objetivos, as prioridades da vida e o modo como o tempo está sendo usado;

6. Investir em relacionamentos duradouros de amizade e companheirismo;

7. Participar de grupos de afinidade;

8. Buscar exercitar-se com regularidade;

9. Aprender e exercitar técnicas de relaxamento e descontração;

10. Cultivar e aprofundar a confiança em Deus, particularmente, através da oração.

 

  

Unidade 3

 

O QUE É DEPRESSÃO

 Amauri Munguba Cardoso *

 

É uma das doenças psíquicas mais freqüentes e de efeitos mais nocivos sobre as pessoas de nossa época. Seus sintomas mais conhecidos são: tristeza, apatia, fadiga, insônia ou hipersônica, falta de apetite, perda de memória, pensamentos derrotistas, idéias de morte etc.

 

A depressão pode manifestar-se de forma aguda, sendo em geral de curta duração, ou crônica, arrastando-se por anos. Quando resulta de algum acontecimento real, seja uma perda ou qualquer outro evento traumático, é chamada de reativa ou exógena. Quando surge espontaneamente, sem qualquer explicação aparente, é chamada de endógena.

 

Quem jamais viveu uma depressão pode ter uma idéia do que seja experimentá-la, se prolongar de modo infinito a sensação de um momento agudo de dor moral, abatimento ou de frustração. Para o deprimido o tempo parou e desapareceram todas as possibilidades de um futuro diferente ou melhor.

 

A BÍBLIA E A DEPRESSÃO

 

Embora não apareça com este nome, várias passagens descrevem sensações ou experiências que podem ser classificadas como depressão:

 

a) Elias, o profeta, depois de experiências gloriosas em sua carreira, viveu um momento agudo de depressão, no qual perdeu toda a perspectiva de sentido, chegando mesmo ao desejo da morte (I Reis 19:1-10).

b) Jó, em meio ao seu imenso sofrimento, experimentou momentos de depressão, em decorrência das perdas reais, frustração de expectativa e da rejeição social de que foi vítima (Jó 3:1-26).

c) Davi, o rei e salmista, deixou registradas vária expressões de profundo pesar e abatimento vividos na alma (Sl. 88:1-18; 102:1-11; 137:1-4).

d) Jesus Cristo, no Getsêmani, viveu momentos de solidão, angústia e pavor que ultrapassam nossa mais fértil imaginação (Mt. 26:36-38).

 

AS CAUSAS DA DEPRESSÃO

 

FATORES FÍSICO-GENÉTICOS: A existência de tumores cerebrais, o desequilíbrio químico cerebral, distúrbios hormonais, faltas de sono e nutrição adequada, são elementos que interferem na manifestação da depressão. Embora não se possa afirmar a exclusivamente a hereditariedade da depressão, algumas pessoas estão mais predispostas que outras.

 

FATORES AMBIENTAIS E EMOCIONAIS: A privação do contato caloroso com os pais, o abandono, a rejeição ou o abuso sexual vividos na infância, são alguns dos fatores que podem mais tarde desencadear uma depressão. O sentimento de inadequação, a baixa auto-estima, geralmente, contribui para tornar alguém mais vulnerável à depressão.

 

PERDAS: A perda da saúde, da mobilidade, da liberdade, do emprego, de uma pessoa querida e outras perdas significativas, são muitas vezes suficientes para desencadear um processo depressivo.

 

IRA: É largamente aceito que a depressão pode envolver um sentimento não trabalhado de raiva. Seria a raiva não manifesta voltada contra o próprio sujeito.

 

CULPA: Culpa e depressão geralmente se associam. Quanto mais rígida e castradora for à educação, maiores a chances do indivíduo sentir-se culpado e, conseqüentemente, predisposto à depressão.

EFEITOS DA DEPRESSÃO

 

INFELICIDADE E INEFICIÊNCIA: Desânimo, autocrítica exagerada e atitude de desesperança são sentimentos que comumente acompanham o deprimido. A depressão surge como um roubo das energias produtivas, deixando o sujeito moroso e improdutivo e profundamente desgostoso.

 

RETRAÇÃO E ISOLAMENTO: Não há interesse por encontros e atividades sociais. Tudo é visto como muito exigente, quando não impossível. O isolamento pode conduzir ao álcool, às drogas, ao refúgio da televisão ou dos devaneios.

 

SINTOMAS ASSOCIADOS: Em alguns casos a depressão pode vir acompanhada e de sintomas como agressividade, tendência a acidentes, dificuldades sexuais, trabalho compulsivo, mau humor e irritabilidade constantes. Estes sintomas podem muitas vezes mascarar a depressão.

 

SUICÍDIO: Os maiores índices de suicídios ocorrem entre pessoas que vivem sós, adolescentes e deprimidos. Existem comportamentos suicidas que às vezes passam desapercebidos: dirigir em velocidade excessiva, abusar de bebidas e drogas, expor-se a perigos desnecessários etc. Nem todos os deprimidos são suicidas, contudo convém sempre ter cuidado com pacientes neste estado, afastando os riscos imediatos, lembrando sempre que a depressão é uma doença.

 

PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO

 

ESPERE MOMENTOS DE DESÂNIMO: Há experiências que não podem ser evitadas, aflições, tribulações e dificuldades abatem-se sobre todos indistintamente (Jo. 16:33; Ec. 11:8; Pv. 24:10; Rm. 3:3-5; Tg. 1:2-4,12). Sem essas experiências não cresceríamos. A vida cristã não é sempre sorrisos, abraços e cânticos. Também há árduas lutas, em meio às quais formamos nosso caráter. Mantendo uma atitude realista frente à vida nos precavemos de decepções desnecessárias ao longo da caminhada.

 

APRENDA A TRATAR COM A IRA E A CULPA: Este aprendizado encontra-se entre as melhores profilaxias da depressão. Muitos temos dificuldade em lidar com as determinadas emoções, como se fosse errado experimentá-las e pior ainda expressá-las. O cristão continua sendo uma pessoa. Reprimir suas emoções não o torna melhor pessoa, pelo contrário pode Ter efeito contrário. Jesus foi homem em plenitude, permitindo-se contactar e manifestar uma variedade de experiências emocionais: alegria, tristeza, indignação e ira (Mc. 3:5; Mt. 23:13-33; Jo. 2:13-17). A apropriação do perdão divino é um dos mais poderosos recursos terapêuticos jamais posto à disposição das pessoas, abre caminho para uma vida leve e descomplicada.

 

ENCHA A CABEÇA COM O QUE É BOM: Aquilo sobre o que concentramos nossos pensamentos e atenção influencia nossos estados emocionais. Não devemos subestimar a importância de manter a mente de cheia de bons pensamentos (Fl. 4:8; Rm. 12:2; Sl. 1).

 

MANTENHA CONTATO COM GRUPOS DE COMUNHÃO: Nenhum de nós pode alcançar vida plena e saudável vivendo na solidão. Participar de grupo, manter contato com os amigos e cultivar relacionamentos em geral, contribui para prevenir a depressão.

 

VENÇA O EGOCENTRISMO E AJUDE OS OUTROS: Pessoas ensimesmadas perdem excelentes oportunidades de trocar experiência, dar e receber contribuições existenciais. O ato de ajudar carrega embutido um grande potencial de ajuda também para o ajudador. Sentir-se útil e estar envolvido em movimentos de promoção humana garante um sentimento de aprovação muito saudável.

 

APROFUNDE A CONFIANÇA E INTIMIDADE COM DEUS: Se a religião tornar-se uma rotina esvaziada, fica perdido um significativo contato revigorador com as fontes que nutrem e sustentam a existência humana. Uma fé viva é também um poderoso antídoto contra o desânimo. Se não pode eliminar as aflições, habilita para enfrentá-la com menores danos pessoais. Abrir-se para uma relação estreita com o Criador põe-nos em contato com um amor indestrutível e confiável (Jo. 14:1; Rm. 8:35-39; 15:13; Fl. 4:111-13 ).

 

 

* O Autor é Bacharel em Teologia, Psicólogo, Pastor Batista e Psicoterapeuta.


 

Unidade 4

 

CURANDO FERIDAS EMOCIONAIS

 

Roberta Batista Silveira do Carmo *

 

 

O líder de um grupo tem grandes responsabilidades. Dentre elas, gostaria de chamar a atenção para o fato de que o líder é exemplo para os seus liderados, assim, seus comportamentos, suas atitudes, a forma como ele lida com seus sentimentos irão refletir diretamente em seus liderados e, mais do que isso, seus liderados irão mirar-se em seu exemplo e buscar sua orientação quando for necessário. Por isso, nesta Unidade abordaremos quais são as principais causas de feridas emocionais e quais são os principais mecanismos utilizados quando nos deparamos com estas situações.

 

Emoção pode ser definida como a experiência de sentimentos subjetivos que apresentam valor positivo ou negativo para o indivíduo, como por exemplo: alegria, amor, tristeza, medo, raiva. Quando falamos em feridas emocionais, estamos nos referindo àquelas emoções que trazem consigo um valor negativo.

 

Frustrações, conflitos e outras tensões estão associadas a estados emocionais desagradáveis, como ansiedade e raiva. Quando estão diante de situações como estas, as pessoas respondem de um modo que lhes permitam evitar, escapar ou reduzir sua aflição e/ou tratar de um determinado problema. A estratégia adotada dependerá da situação em questão, das experiências anteriores, bem como de características pessoais. Nem sempre as respostas frente a tais situações se dão de forma consciente.

 

Veremos agora as estratégias mais comuns que são utilizadas para enfrentar situações de tensão. Algumas vezes, as pessoas respondem através da ação: por solução deliberada de problema, agressão regressão, recuo e/ou fuga:

 

SITUAÇÃO DELIBERADA DE PROBLEMA

Muitas vezes, as pessoas vêem conflitos, frustrações e situações parecidas, como problemas que precisam ser resolvidos. Assim, avaliam racionalmente a situação e decidem sobre as providências apropriadas. Depois, fazem preparações diretas para fortalecer seus recursos e reduzir o dano potencial;

 

AGRESSÃO

A frustração e outros estresses podem conduzir a raiva e a agressão. A agressão é raramente uma resposta produtiva e pode levar a conseqüências trágicas. Quando uma ameaça é vaga, difícil de ser exatamente localizada, poderosa ou perigosa, as pessoas, algumas vezes, deslocam sua agressão e atacam alvos convenientes. Nomear “bodes expiatórios”, ou seja, culpar vítimas inocentes pelas perturbações que uma pessoa sente e agredi-las, é um exemplo comum dessa prática;

 

REGRESSÃO

Algumas vezes as pessoas enfrentam estressem retornando a modos de comportamento característicos de idades mais jovens. A regressão pode ser empregada porque oferece uma fuga, um retorno às condições passadas de amor e segurança;

 

RECUO

O recuo é uma resposta comum à ameaça. Quando as pessoas se retraem, escolhem não agir. Muitas vezes a apatia e a depressão acompanham este comportamento;

 

FUGA

Quando as pessoas se sentem dominadas por uma tensão, algumas vezes procuram a fuga. Para isso, podem simplesmente deixar corporalmente a situação ou usar um método menos direto. O comportamento estereotipado repetitivo ou fixo, por exemplo, pode desviar a atenção de uma ameaça e prover um meio temporário de fuga mental.

Outras formas utilizadas para enfrentar situações de tensão são os mecanismos de defesa, conceito que surgiu nos trabalhos de Freud. Mecanismos de defesa são os diversos tipos de processos psíquicos, cuja finalidade consiste em afastar um evento gerador de angústia da percepção consciente. Os mecanismos de defesa são funções do ego e, por definição, inconscientes. O ego situa-se em parte no consciente e em parte no inconsciente. Como sede da angústia, ele é mobilizado diante de um sinal de perigo e desencadeia uma série de mecanismos repressores que impedirão a vivência de fatos dolorosos, os quais o sujeito não está pronto para suportar, ou seja, diante de uma grande dor, os acontecimentos são reprimidos e escapam à percepção consciente. Veremos agora alguns dos principais mecanismos de defesa do ego:

 

REPRESSÃO

É o principal mecanismo de defesa, do qual derivam os demais. A repressão é definida como a exclusão, da consciência, de motivos, idéias, conflitos, lembranças que excitam ansiedade. Quando a repressão está funcionando, o que foi banido não entra na consciência, embora influencie o comportamento do sujeito;

 

NEGAÇÃO DA REALIDADE

Ao negarem a realidade, as pessoas ignoram ou recusam-se a reconhecer a existência de experiências desagradáveis, a fim de se protegerem;

 

RACIONALIZAÇÃO

Muitas vezes a racionalização envolve pensar em razões socialmente aceitáveis para o comportamento, a fim de a pessoa ocultar a verdade de si mesma. Também ocorre racionalização quando as pessoas se “enganam”, considerando que uma situação má é realmente boa ou vice-versa;

 

INTELECTUALIZAÇÃO

Ao usarem a intelectualização, as pessoas tratam de situações que comumente gerariam fortes sentimentos de um modo desapegado, analítico, intelectual. Em outras palavras, tratam experiências potencialmente estressantes como eventos a estudar ou sentir curiosidade a respeito, a fim de evitar envolver-se emocionalmente. A intelectualização permite as pessoas reduzir o impacto de incidentes aflitivos e aumenta a capacidade de responder objetiva e desapaixonadamente;

 

FORMAÇÃO REATIVA (ou formação de reação)

Quando as pessoas ocultam de si próprias um motivo real ou uma emoção e expressam o oposto por atitudes e comportamentos. Este mecanismo permite a um indivíduo evitar a ansiedade associada a ter de enfrentar características pessoais de que ele não gosta. O ódio é algumas vezes disfarçado por uma exagerada exibição de amor, a hostilidade por bondade, etc;

 

PROJEÇÃO

As pessoas que usam projeção são rápidas em perceber e aumentar as características pessoais nos outros, das quais não gostam e não reconhecem em si próprias. Julga-se que este mecanismo reduz a ansiedade que advém de enfrentar características pessoais ameaçadoras.

 

Não há receita padrão para a cura de feridas emocionais, pois cada caso tem suas próprias características e singularidades. De forma geral, pode-se destacar que a busca pelas respostas desejadas através do contato pessoal com o próprio Deus, através da oração; com o pastor da Igreja; ou com um irmão em Cristo, para uma conversa sobre o assunto, são, certamente, boas formas de se iniciar o processo de cura de feridas emocionais. Não se pode esquecer, no entanto, que a busca por auxílio especializado pode, também, ser muito útil (ou até mesmo indispensável, em certos casos) para que o processo seja completamente eficaz. O importante é que o líder esteja totalmente empenhado em não se entregar, utilizando de todas os recursos éticos possíveis para a resolução de seus conflitos emocionais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

DAVIDOFF, L. Introdução à Psicologia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983.

RAPPAPORT, C.R. Psicologia do Desenvolvimento. Volume 1. São Paulo: EPU, 1981.

STRATTON, P.; HAYES, N. Dicionário de Psicologia. São Paulo: Pioneira, 1992.

 

* A autora é Psicóloga e Pós-Graduanda em Saúde Mental da Infância e Adolescência.

Unidade 5

 

SOLIDÃO DO LÍDER

 Amauri Munguba Cardoso *

 

 

LIDERANÇA: UM LUGAR SOLITÁRIO

 

Ocupar a cadeira do líder não poucas vezes também representa abraçar uma condição solitária. Por mais que a liderança seja participativa e que as responsabilidades e decisões sejam compartilhadas, haverá momentos em que o líder estará só para apontar o rumo ou assumir o ônus da posição.

 

Quando Jesus viveu os momentos mais dramáticos de sua vida, embora tenha convidado seus discípulos mais íntimos, teve que vê-los dormirem enquanto sozinho debatia-se em agonia diante do Pai. Por mais chegados que fossem não estavam aptos para enfrentar o peso daquele momento e dividir com o mestre as dores dos últimos instantes (Mt. 26:36-45).

 

O apóstolo Paulo chegou aos atos finais de sua admirável obra missionária, solicitando encarecidamente a presença do seu discípulo Timóteo, em face da solidão que experimentava na prisão. Todos os demais cooperadores, com exceção de Lucas, haviam tomado outros rumos. Suas palavras soam pesadas quando afirma: "todos me abandonaram"; "procura vir ter comigo depressa" (II Tm. 4:16,9).

 

Muitos se apressam a dar apoio, oferecendo seus préstimos e companhia, quando as circunstâncias são amenas ou favoráveis, nos grandes acontecimentos ou reuniões públicas. Nas horas de angústia, de lutas extremas e ocultas, o número dos que podem perseverar diminui consideravelmente. Assim, o líder é muitas vezes levado a enfrentar sozinho horas dramáticas e decisivas.

 

O DESERTO COMO EXPERIÊNCIA NECESSÁRIA

 

As Escrituras repetem muitas vezes uma experiência que se tornou integrante do processo de formação do caráter de alguns líderes. A peregrinação inicial pelo deserto. O deserto bem pode representar a vivência da solidão necessária para o aprimoramento de aspectos acessíveis apenas na longa e fértil solidão criativa.

 

Moisés andou anos pastoreando as ovelhas do sogro, por regiões inóspitas, após matar um egípcio. Foi lá que, diante das chamas que envolviam a sarça, no pé do monte Horebe, ouviu a maravilhosa convocação divina (Ex. 3:1-22).

 

João Batista viveu nos deserto, até surgir como porta-voz de uma mensagem poderosa e convincente, atraindo as multidões ao seu encontro. Na solidão, distante dos centros religiosos oficiais, destilou sua teologia pré evangélica (Mt. 3:1-10).

 

Paulo, após sua conversão e antes de iniciar suas peregrinações missionárias, passou alguns anos nas terras desérticas da Arábia. Foi na meditação, reflexão e oração vividos em solidão, que amadureceu suas novas convicções cristãs (Gl. 1:15-17).

 

Jesus, antes de iniciar seu ministério público, foi pelo Espírito conduzido ao deserto para dias de intensa luta espiritual. Dali voltou, após a vitória solitária sobre o inimigo, no poder do Espírito, para cumprir sua maravilhosa tarefa (Lc. 4:1-14).

 

A SOLIDÃO ILUSÓRIA

 

O Profeta Elias foi protagonista de uma inesquecível cena do Antigo Testamento (I Rs. 19:1-18). Após realizar feitos impressionantes, atuando como instrumento vivo e poderoso do Senhor, fugiu atemorizado pelas ameaças de Jezabel, mergulhando numa inesperada depressão. Entre as alegações que faz há uma que chama a atenção: "e eu fiquei só" (10,14). Aos olhos do profeta atemorizado não havia mais como prosseguir sua tarefa em face da solidão. A Palavra do senhor o alcança de modo absolutamente distinto: "Vai volta ao teu caminho... conservei em Israel sete mil; todos os joelhos que não se dobraram diante de Baal" (15-18).

 

A Solidão de Elias era ilusória, produto dos sentimentos de inferioridade e medo que o assaltaram, infiltrando-se pelas brechas da depressão. Havia ainda muitas tarefas a realizar, muitos feitos a serem produzidos pela mesma força criativa que nele outras vezes já se operara. Elias não estava só, visto que havia ainda muitos fiéis à aliança com Javé. No embate contra as forças do mal, enfraqueceu-se. Abatido deixou-se arrastar pelo sentimento ilusório da solidão.

 

Só pode ultrapassar aquela situação quando, carinhosamente desmascarado pelo Senhor, encontrou em contato com novas perspectivas de Sua presença e atuação. As palavras que idtificam a denúncia do Senhor para aquela falsa solidão é: "que fazes aqui, Elias?". De fato este não é o lugar adequado para se estar, a solidão de quem se põe no lugar de vítima desamparada. Não é esta uma solidão produtiva.

 

Não raro o líder pode mergulhar numa ilusória sensação de abandono e solidão. Quanto mais carregar o sentimento de inteira e última responsabilidade, mais perto pode estar desta experiência. Sua decepção pode tornar-se desproporcional aos fatos, seu pesar insustentável e sua disposição de ânimo miseravelmente deprimida. Quanto mais só no exercício da liderança, maior a solidão diante dos fracassos reais ou aparentes ao longo da carreira.

 

A SOLIDÃO PRODUTIVA

 

Jesus é quem nos oferece o exemplo mais encorajador de solidão produtiva e fértil. Em meio ao agitado e condensado tempo de ministério, criou vários momentos de retiro pessoal, onde buscava revigorar suas energias espirituais e melhor orientar sua caminhada. Ilusão imaginar que lhe teria fácil realizar estes feitos.

 

Quando se retirou após a multiplicação dos pães, encontrou seus discípulos desesperados em meio a uma tempestade (Mt. 14:22-33).

 

Quando depois de um retiro de oração, decidiu percorrer o caminho em direção a outras cidades, encontrou a resistência das multidões, suplicando que não os deixasse (Lc. 4:42,43).

 

Após curar e atender às necessidades de numerosas pessoas, procurava lugares solitários, onde orava em busca de recompor suas forças (Lc. 5:15,16).

 

A solidão era para Ele uma necessidade. Alimentava-se na reflexão, na contemplação e na oração. O mesmo conselho que dera aos discípulos sobre entrar no lugar secreto para a oração, praticou ao longo da carreira ( Mt. 6:6). Ao voltar desses momentos a sós estava revigorado para oferecer novos ensinos pronto para doar-se aos necessitados. Jesus não dispensou o mergulho solitário antes de tomar as decisões capitais do seu ministério, como na escolha dos Doze (Lc. 6:12-16), ou na agonia do Getsêmane (Mt. 26:36-46). Há uma dimensão fértil e criativa que só pode ser alcançada na solidão e no silêncio do deserto produtivo.

 

Unidade 6

 

FRACASSOS, DERROTAS E FRUSTRAÇÕES:
APRENDENDO A CRESCER

 

Roberta Batista Silveira do Carmo *

 

 

Por ser a pessoa de referência em um grupo, o líder se torna um alvo fácil para esse mesmo grupo quando as coisas não estão indo bem. É muito comum ouvirmos queixas do grupo responsabilizando somente o líder pelo fracasso. O mesmo raramente acontece quando a vitória é alcançada. Ou seja, quando o grupo atinge seus objetivos, todos querem e se orgulham em dizer que fizeram parte daquela vitória, mas, quando há um fracasso, muitos não procuram saber onde o grupo errou, e culpam o líder. Isso acontece porque para muitas pessoas é muito difícil assumir os seus próprios erros e ter que se deparar com as suas limitações e assumir suas responsabilidades. Outras vezes isso acontece pelo próprio estilo de liderança imposto pelo líder, onde realmente ele se coloca em uma posição de assumir todas as responsabilidades pelo que acontece com o grupo. O importante, após uma derrota, é que o líder possa transmitir para os seus liderados que poderão crescer através das dificuldades pelas quais passaram, fazendo com que essa atitude tenha caráter preventivo e curativo, em relação às futuras dificuldades e perante o momento fracassos, respectvimamente.

 

Vejamos agora como um grupo se organiza e como fazer para que ele cresça e se desenvolva.

 

Quando um grupo começa a funcionar, podemos distinguir duas estruturas fundamentais:

 

1-         Quem tem poder sobre quem (estrutura de poder);

 

2-         Quem trabalha para quem (estrutura de trabalho).

 

Na estrutura de trabalho, as linhas de atividade se estabelecem nos modos como as tarefas são distribuídas e na maneira pela qual os papéis são definidos.

 

Na linha de autoridade, estabelecem-se os tipos de liderança:

 

AUTOCRÁTICA

O líder aspira o poder total, completo e absoluto sobre os liderados, não delega funções, não distribui responsabilidades e tem por lema: eu sou o poder;

 

PERMISSIVA (laissez-faire)

O líder não assume responsabilidades, deixa que o grupo tome as suas decisões, crê que assim o grupo irá se auto-afirmar e desenvolver a criatividade e a espontaneidade, seu lema é: o poder são os outros;

 

DEMOCRÁTICA

O líder é cooperativo, não só assume como distribui responsabilidades, o grupo discute, delibera e executa como um todo, seu lema é: o grupo é o poder.

 

Entendemos que, em um contexto eclesiástico, o estilo democrático de liderança é o que melhor contempla os ensinamentos cristãos.

 

O grupo se desenvolve a medida em que se torna mais eficiente e mais criativo na busca por seus objetivos. Neste sentido, a integração é fundamental. O grupo integra-se quando passa a constituir um todo na união de seus elementos.

 

No desenvolvimento de um grupo, há três fases a serem consideradas: individualista, de identificação e de integração.

 

FASE INDIVIDUALISTA: Nos encontros iniciais do grupo, os indivíduos tendem a se auto-afirmar e isso é uma decorrência das necessidades fundamentais de auto-afirmação das pessoas, de lutarem para ser aceitas. O líder não deve limitar, acelerar, alimentar ou desestimular esta fase, ela faz parte do desenvolvimento do grupo. Quando as pessoas se conhecem melhor, passam a aceitar-se reciprocamente.

 

FASE DE IDENTIFICAÇÃO: Já que os indivíduos se aceitaram mutuamente como pessoas, certos membros começam a reunir-se em subgrupos. São os subgrupos minoritários, que surgem essencialmente nos momentos de decisão. São os indivíduos que compartilham, às vezes, das mesmas apreensões e temores.

 

FASE DE INTEGRAÇÃO: Quando os indivíduos se sentirem aceitos e tiverem certeza de que suas decisões serão levadas em consideração, o grupo começará a integrar-se.

 

 

A liderança deverá prevenir-se, verificando se com a pretendida integração, alguém não foi excluído e se há verdadeiramente coesão e solidariedade.

 

No processo de integração de um grupo, há etapas de crescimento. A primeira delas é o chamado momento de ansiedade. Em qualquer processo de crescimento, há momentos de ansiedade e isso acontece também com o grupo e, durante o crescimento, desenvolvemos comportamentos anti-ansiedade que constituem a capacidade de tolerância à frustração. Os indivíduos que não passam por esse processo de desenvolvimento terão tendência a regredir, recorrendo a mecanismos de defesa e agressão.

 

A segunda etapa deste processo é a complementaridade. A integração realiza-se não pelo nivelamento das diferenças entre os indivíduos, mas por sua complementaridade. Cada membro percebe-se a si mesmo como diferente, mas incompleto. Cada um deles tem o outro membro como complemento no grupo. Todos dependem de todos para constituir uma integração. Os membros se interdependem.

 

Além dessas duas etapas, existem também mais três critérios importantes para a integração do grupo, critérios estes que dependem principalmente de uma atuação eficaz da liderança:

 

COMUNICAÇÃO AUTÊNTICA: quando todos os membros já estabeleceram uma linguagem comum e recorrem a símbolos e códigos próprios, está estabelecida a comunicação autêntica. Se a liderança conseguir estabelecer relações interpessoais comuns entre ela e os membros do grupo, pode-se dizer que a comunicação é autêntica. Se a comunicação for autêntica, mais condições terá de ser aberta e circular. A comunicação hierarquizada, de subordinação, cria no grupo bloqueios e filtragens, gerando mal-entendidos, conflitos e, em decorrência, a integração se torna artificial e comprometida;

 

ALTO GRAU DE COESÃO: depois que a comunicação se tornou autêntica, dentro de um grupo, os elementos estarão capacitados a participar integralmente das atividades do grupo, pelo surgimento do sentimento de pertencer a. O grupo se torna coeso quando o indivíduo que dele participa sente certa culpa diante da necessidade de ausentar-se, ou de faltar e por isso se justifica;

 

PERMEABILIDADE DE FRONTEIRAS: quando o grupo desenvolve uma comunicação espontânea e adquire coesão, ele se torna de tal forma solidário em função de seus objetivos que a entrada ou a saída de um elemento não alteram e anão ameaçam a integridade do grupo. O elemento novo sente-se à vontade e a ausência de um participante não lhe altera o rendimento. Toda a colaboração que vem do exterior é bem recebida e não altera a integridade do grupo.

 

 

Finalmente, um grupo torna-se eficiente quando seus membros estão integrados; quando tiverem sido estabelecidas, de modo duradouro, as relações interpessoais; quando houver interdependência entre seus participantes; quando os membros sentirem que se complementam uns aos outros; quando o líder se tornar um elemento catalisador das preferências do grupo, de um lado, e coordenador das atividades, na execução das tarefas, de outro e, quando os elementos sentem que estão “pensando em grupo”.

 

O líder eficaz cria estima e respeito entre os membros, de tal forma que se conscientizem de que cada um é capaz e competente na execução da tarefa que lhe foi designada. Para atuar com eficiência, o líder deve ter condições de comportar-se de modo autêntico ao libertar-se de seus medos, de si mesmo e da dependência do outro; deve ser objetivo nas relações interpessoais, a ponto de aceitar-se e de aceitar o outro. Já o líder defensivo e com compulsiva necessidade de afirmar sua personalidade a qualquer custo estará atuando como elemento desagregador do grupo. Enquanto permanece defensivo, está preocupado em defender-se e em proteger seus direitos apenas, comunicando-se com os outros através de canais formais e distorcidos.

 

Visto dessa forma, liderar torna-se um processo contínuo e crescente, o que faz perceber que fracassos, derrotas e frustrações fazem parte do contexto e que, observados dessa forma, proporcionarão contínuo crescimento e amadurecimento, assim como constantes oportunidades de avaliação do crescimento do próprio grupo e autocrítica por parte do líder.